domingo, 21 de setembro de 2008

O "Nós" que tem que ser "Vós"

O mito Messiânico tem por base a crença na vinda de um enviado que terá como causa a libertação de um povo oprimido. O mito messiânico foi transposto para a cultura portuguesa através do mito Sebástico. O mito Sebástico ou Sebastianismo surgiu na cultura popular após o desaparecimento do jovem rei D.Sebastião a 4 de Agosto de 1578 na batalha de Alcácer-Quibir e que resultaria na perda da independência nacional dois anos depois em 1580 para a coroa espanhola por falta de herdeiros. Esta crença pretende caracterizar a espera, o regresso, daquele que restaure a soberania e tudo o que perdeu com ela. Os sentimentos causados por essa espera são a angústia, a latência, o tédio, a monotonia e, consequentemente, a inacção.

O sebastianismo inscreveu-se na matriz racional do povo Português e persistiu até aos nossos dias, assumindo várias formas, mas mantendo sempre a figura do regresso do Salvador da Pátria. Este foi aliás o aproveitamento feito pelo regime do Estado Novo para a mistificação da figura do Salazarismo, e foi corporizado de tal forma, que nos 2 últimos anos da sua vida, entre 1968 e 1970, mesmo estando debilitado fisicamente como resultado de um acidente que o deixou incapacitado, Salazar continuou a ser apresentado pelo regime como o Presidente do Conselho. O vazio causado pelo mito Sebástico tinha que continuar a ser preenchido no imaginário das pessoas.

Nos dias de hoje, o mito permanece e pode facilmente encontrar-se a sua influência nos discursos políticos. A forma mais directa de utilização do mito é a utilização do “Nós” como figura principal do discurso político: “Nós [partido político] vamos resolver os vossos [dos cidadãos] problemas...” . Numa sociedade onde as pessoas não se sentem donas do próprio destino, soa como canção de embalar, que não é mais que uma versão da célebre Canção do Bandido: “Ocupai-vos dos Vossos prazeres, que Nós ocupar-nos-emos dos vossos problemas!”. Como consequência aquele que melhor entoar esta canção torna-se governante, o que representa um critério de escolha muito medíocre, e que por um lado explica a eleição de governantes, como por exemplo, e apenas para citar um caso recente, de um primeiro-ministro que mesmo cabulando mais que o maior dos cábulas e fazendo exames em casa não terminou o curso em condições (tecnicamente o curso em questão não foi acabado). Podiam ser citados muitos outros casos da direita à esquerda, da esquerda à direita de representantes do povo que não cumprem os “mínimos olímpicos” que deviam ser exigidos por esse mesmo povo.

O panorama alterar-se-à quando o discurso cómodo para todos do “Nós” for assumido como o discurso do “Vós”: “Vós [cidadãos] terei que escolher o vosso caminho e percorrê-lo afastando as pedras!”. O discurso deverá ser assumido no mínimo pelos cidadãos que não podem esperar mais enquanto a pobreza aumenta, a população envelhece e a criminalidade e o desemprego alastram, tendo clara a consciência de que aquele que disser “Eu consigo resolver os vossos problemas nesta sociedade de relações complexas”, ou é mentiroso ou é ignorante!

Para aqueles que procuram e exigem soluções aqui ficam sugestões que podem melhorar a parcela de terra à vossa volta, e que devem ser criticadas/acrescentadas por todos aqueles lerem este texto, sugestões essas sob o lema “É preciso haver uma lei para obrigar as pessoas a reciclar?”:

  1. Reciclar e promover o uso de objectos em segunda mão;
  2. Não recusar entrar em museus, castelos e espectáculos de artistas portugueses apenas porque são pagos;
  3. Fazer o esforço de alternar o transporte público com transporte particular, e se possível usar bicicletas para deslocações;
  4. Pedir sempre que possível factura por serviços recebidos;
  5. Poupar em cigarros e cafés;
  6. Poupar combustível reduzindo as acelerações.
  7. Aprender línguas estrangeiras;
  8. Ler livros, se possível não apenas romances, e se possível também livros noutros idiomas;
  9. Mudar de canal quando o telejornal abre com noticias de futebol;
  10. Dar sangue.

Liberdade, Onde Estás? Quem Te Demora

Liberdade, onde estás? Quem te demora?
Quem faz que o teu influxo em nós não Caia?
Porque (triste de mim!) porque não raia
Já na esfera de Lísia a tua aurora?

Da santa redenção é vinda a hora
A esta parte do mundo que desmaia.
Oh! Venha... Oh! Venha, e trémulo descaia
Despotismo feroz, que nos devora!

Eia! Acode ao mortal, que, frio e mudo,
Oculta o pátrio amor, torce a vontade,
E em fingir, por temor, empenha estudo.

Movam nossos grilhões tua piedade;
Nosso númen tu és, e glória, e tudo,
Mãe do génio e prazer, oh Liberdade!

Manuel Maria de Barbosa Du Bocage (Setúbal, 1765 – Lisboa, 1805)

domingo, 14 de setembro de 2008

Quando foi a última vez que olhou para o céu?



Não deve haver fotografia mais simples que aquela que pretender captar simplesmente o céu que nos envolve. Independentemente do ângulo, a perspectiva, tal é a imensidão, surge sempre de forma idêntica como um horizonte longínquo mas libertador.

Esta fotografia simples como qualquer outra é para todos aqueles que durante todos os seus dias, e quem diz dias, pode em alguns casos afirmar ao longo de semanas, meses, anos, não consegue sob ângulo nenhum, incluir nas suas vivências esta visão simples do nosso Mundo. No Portugal de hoje, muitos são aqueles que caminham ao longo dos dias com uma postura inclinada, qual homo erectus, sinónimo de submissão, desistência, inacção. As causas destes movimento por inércia e que no fim resulta em seres que mais não são que “escravos dos acontecimentos” são várias e inúmeras mas todas ultrapassáveis. Nos dias de hoje a afirmação pessoal surge na maior parte dos casos por factores como o estatuto social, a aparência física, o compadrio, a bajulação e muitos outros factores superficiais sem muito conteúdo, que são apesar de tudo elementos da chamada “inteligência social”. No entanto são factores circunstanciais e de alguma desigualdade que resultam na maior parte dos casos em submissão da inteligência e vontade própria. Nem todos têm a capacidade e/ou a oportunidade de cometer tal sacrifício, resultando daí muitas posturas encurvadas de resignação.

A resignação deve ser dar lugar à confiança e à autodeterminação para que a inteligência, a cultura, a dedicação, o esforço e o trabalho sejam a base da afirmação das ideias e a libertação das acções. É tempo de soerguer, de fechar o punho, inclinar a cabeça para o céu, sentir o vento, fechar os olhos e sentir aquela “estranha leveza do ser” que nos eleva acima das vivências comuns e diminui o gigante mundo à nossa volta à dimensão de que tudo parece possível. Este é o nosso tempo...

sábado, 6 de setembro de 2008

Homenagem aos Atletas Olímpicos

Queria com este texto, e face ao que foi o julgamento da "participação oral" dos atletas portugueses nos passados jogos olímpicos, prestar uma pequena e devida homenagem a esses mesmos atletas.

Portugal contribuiu com 77 atletas para os Jogos Olímpicos de Pequim 2008. Nessa comitiva encontram-se atletas profissionais, atletas amadores que conciliam o desporto com outra actividade profissional ou que suspendem carreiras profissionais, e até estudantes. A maior parte desses atletas são ignorados pelo público em geral no que concerne à sua prática desportiva e as competições em que participam. No entanto, de 4 em 4 anos, querendo ou não, é-lhes atribuída a responsabilidade de preencher parte do espaço oco do “Orgulho da Pátria”, preceito característico do regime do Estado Novo, e em caso contrário, é necessário o pedido de desculpas. Convenhamos que, justificadamente ou não, e atendendo às estatísticas, a Pátria não faz muito por essas modalidades, designando ainda essas modalidades como "Modalidades Amadoras".

Num meio onde a prática desportiva está praticamente monopolizada pelo futebol, o acesso a essas modalidades é limitado, especialmente nas zonas interiores do país. Essas limitações vão desde a falta de capacidade das escolas de diversificarem as opções do desporto escolar, à inexistência de associações desportivas que disponibilizem as modalidades, poucos treinadores com qualificação e experiência, até às limitações financeiras. Mas porque a vontade humana supera muitos obstáculos, tudo o referido atrás é em muitos casos superado através do prazer e da dedicação das pessoas envolvidas. No entanto, há um elemento essencial para a progressão em qualquer modalidade que não existe em Portugal, que é o da COMPETIÇÃO. A maior parte das modalidades apresenta níveis competitivos baixos e desiguais ao nível do país. A razão principal é a falta de atletas a competir. Não há talento que se conserve sem competição e são muitos os talentos que se acabam por perder. As modalidades ficam mais pobres e menos visíveis para que outros as possam considerar nas suas opções, e no limite são horizontes que se vão fechando.

Tudo isto reveste o esforço de todos aqueles que atingiram os JO de maior importância, principalmente o dos mais amadores, porque para além das marcas desportivas que outros jovens vão considerar na sua progressão, são referências que surgem no horizonte para a prática dessas modalidades. O desporto é outra forma de conhecimento que nos ensina sobretudo a nobre e natural arte de competir. Tal como devem ser estudados vários géneros literários, também é saudável e recomendado praticar várias modalidades. Curtos ou não, estes são os caminhos que estes atletas ajudam a abrir. Resta quem os queira percorrer…