Os meus dias em Elvas são
bastante rotineiros. Todavia tenho especial prazer em fazer as coisas mais
simples como por exemplo, caminhar até ao centro da cidade. Infelizmente, não
tenho bicicleta comigo pelo que o passeio é sempre a pé. O facto de haver tantas
rotundas faz-me pensar que o trânsito deve ser intenso, e o deve ser ainda mais pela
manhã. Afinal de contas, as rotundas servem essencialmente para isso: melhor o
fluxo de carros. Dessa forma, procuro ir o mais cedo possível para evitar o
barulho do trânsito. Desde o Modelo até ao centro da cidade demorei 15 minutos
e algo me surpreendeu. Apesar de estar um dia fantástico, apenas eu circulava a
pé. Todas as outras pessoas circulavam em carros ou carroças, e não vi ninguém
a circular em bicicleta.
Lembro-me de quando comecei a trabalhar em Antuérpia, na Bélgica. Em dias de mau tempo, ou seja quase todos os dias do ano, no percurso matinal de 3 minutos até à paragem de autocarro, olhava para o céu e queixava-me do tempo, da comida, do trabalho e de tudo o que me irritava. Mas depois, olhava para o lado e via centenas de pessoas a deslocarem-se de um lado para outro em bicicleta, fizesse chuva, neve ou Sol. Admirava particularmente aqueles que transportavam bebés em atrelados que se ligavam às bicicletas. Havia bicicletas especialmente adaptadas para transportar bebés. Importa dizer que as pessoas que usavam a bicicleta iam desde estudantes a executivos de fato e gravata. Para além de ser uma solução que permite poupar dinheiro e ambiente, o que mais me admirava era sentir que aquelas pessoas controlavam o seu próprio destino uma vez que dependiam única e exclusivamente de si próprios, da sua força e resistência para chegar ao destino. O tempo, a imagem e a distância não eram obstáculos para eles fazerem algo que consideravam melhor.
Quando me mudei para o Sul de França, a primeira coisa que fiz foi comprar uma bicicleta. Comecei a levantar-me às 6 da manhã e percorrer 11 Km até ao local de trabalho, enfrentando subidas com rampas de 6 e 8% de inclinação. Foi duro nos primeiros dias mas agora sinto que sou algo mais independente e que tenho um pouco mais o controlo da minha vida.
Olhando em volta pela cidade de Elvas, questiono-me se as pessoas em Elvas controlam a sua vida, ou se pelo contrário, são pessoas muito dependentes. Para se ter controlo da própria da vida penso que é importante haver liberdade de expressão, para que cada um consiga afirmar o que realmente quer. Dentro da liberdade de expressão, temos a liberdade de opinião, a liberdade do dizer e do falar. Esta última, apesar de ser das liberdades mais pequenas, quando não existe, inibe as restantes liberdades. É uma das liberdades primárias e que tem que ser assegurada. Esta reflexão faz-me pensar na demissão em bloco de todos os vereadores da câmara de Elvas na sequência da decisão do Presidente da autarquia em retirar o pelouro ao antigo Presidente. Sendo a retirada dos pelouros uma decisão que está no âmbito das competências do Presidente, poder esse que foi concedido pelos eleitores quando o elegeram, causa estranheza que todos se tenham demitido por um algo que está previsto que possa acontecer. Pode ser o caso, e citando Moliére, o dramaturgo francês, que “quando todos pensam o mesmo, é porque não se pensa muito ”. Ou pode ser o caso em que a liberdade de opinião dos vereadores fosse ignorada ou comprada, e estes tivessem sido “forçados” a demitir-se. A questão que se coloca aqui, é a de que se um vereador, que tem um salário superior à média da população, tem um mandato de 5 anos garantido e que só tem que prestar contas aos seus eleitores, consegue ser facilmente inibido de actuar segundo a sua opinião, então que liberdade de opinião terão pessoas que ganham o salário mínimo, desempregadas, trabalhadores precários ou até trabalhadores independentes que dependam da acção de vereadores, seja pela burocracia ou por negócios. Provavelmente muito pouca ou nenhuma. Por outro lado, se alguém quer provocar eleições, é porque pensa que vai ganhar as eleições, e se assim pensa, é porque considera que tem o controlo da vontade da população. Se de verdade tem o controlo da população então, logicamente, a população, ou a maioria das pessoas, não tem o controlo das suas vidas e, provavelmente, sente que não tem…LIBERDADE DE EXPRESSÃO. Quando assim acontece, as pessoas vivem em eterna dependência e com sentimento de dívida para quem trabalham ou possam trabalhar. Esse sentimento de dívida geralmente é explorado por que detêm o poder, para glorificação e mistificações das suas acções. A minha opinião é de que quem trabalha com rigor e dedicação, nada deve a ninguém.
Como algum mestre Zen terá dito, Há
sempre duas opções na vida: sermos apenas aquilo que somos, sujeitando-nos ao
que nos dão, ou sermos melhor daquilo que somos, procurando a liberdade para aceitar,
ou não, aquilo que nos dão. A mudança exige apenas um passo em frente..
Trânsito em Elvas é algo que ainda
não encontrei…